1. Introdução
O art. 444 da CLT estabelece que as relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
Isto posto, o fornecimento de alimentação seja como cesta básica, vale-refeição ou vale-alimentação constitui benefício que pode ser concedido por liberalidade da empresa ou por determinação contida no documento coletivo do sindicato representativo da respectiva categoria profissional.
Caso a alimentação seja concedida por força do documento coletivo, deverá a empresa observar rigorosamente as condições nele previstas, especialmente quanto à possibilidade de pagamento do benefício em dinheiro, juntamente com o salário mensal, predominando o entendimento de que o sindicato representativo da categoria profissional, dado o seu papel de protetor dos interesses de todos os seus representados, não pode determinar que o benefício seja concedido de forma diferenciada ou de modo a favorecer somente parte dos empregados da empresa.
2. Integração ao Salário
Nos termos do art. 458 da CLT, além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações in natura que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.
É importante destacar que considera-se como parte integrante do salário, as prestações in natura ou também conhecido salário utilidade, toda parcela, bem ou vantagem fornecida pelo empregador como gratificação pelo trabalho desenvolvido ou pelo cargo ocupado.
A alimentação é só uma dessas prestações in natura e, pelo que muitos empregadores têm como verdade, para que haja a integração, independe do desconto efetuado.
A integração ou não ao salário do valor correspondente à alimentação dependerá, única e exclusivamente, de como ocorreu o fornecimento do benefício ao empregado, independentemente, se ocorreu o desconto ou não.
Se este for fornecido sem a aprovação ou em desacordo com as normas estabelecidas pelo Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), esse benefício receberá o tratamento de salário in natura, integrando a remuneração do empregado para todos os efeitos da legislação trabalhista, inclusive para fins de incidência da contribuição previdência e fundiária.
Se, por outro lado, a concessão da alimentação se der por intermédio do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), aprovado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), de acordo com a Lei nº 6.321/76, regulamentada pelo Decreto nº 5/91, o seu valor não será considerado salário in natura e, por consequência, não integrará a remuneração do trabalhador para qualquer efeito legal, sendo irrelevante a forma pela qual o benefício é concedido, se a título gratuito ou a preço subsidiado.
Nesse sentido, estabelece o art. 499 da Instrução Normativa RFB nº 971/09, que não integra a remuneração, a parcela in natura, sob forma de utilidade alimentação, fornecida pela empresa regularmente inscrita no PAT aos trabalhadores por ela diretamente contratados, em conformidade com os requisitos estabelecidos pelo órgão gestor competente.
A contrário sensu, a parcela in natura habitualmente fornecida a segurados da Previdência Social, por força de contrato ou de costume, a título de alimentação, por empresa não inscrita no PAT, integra a remuneração para os efeitos da legislação previdenciária.
Na identificação da referida parcela devem ser observados os seguintes procedimentos, de acordo com o art. 504 da citada Instrução Normativa:
a) caso seja possível identificar os valores reais das utilidades ou alimentos, independentemente da individualização do beneficiário, adotar-se-á o valor efetivamente gasto na aquisição das utilidades ou alimentos;
b) não havendo como identificar os valores reais das utilidades ou alimentos fornecidos, o valor do salário utilidade/alimentação será indiretamente aferido em 20% da remuneração paga ao trabalhador, excluído desta o 13º salário.
O valor descontado do trabalhador referente às utilidades ou alimentos fornecidos deverá ser deduzido da remuneração apurada.
Salientamos ainda que o pagamento em pecúnia do salário utilidade alimentação integra a base de cálculo das contribuições sociais.
2.1. Desconto - Possibilidade
Com a publicação da Lei nº 8.860/94, que acrescentou os §§ 3º e 4º ao art. 458 da CLT, autorizou-se ao empregador, quando do fornecimento da utilidade da espécie alimentação, descontar até o limite de 20%, dos salários dos empregados beneficiados.
Observa-se, dessa forma, que se o valor real da utilidade for superior ao que representa o referido desconto, somente o valor excedente será considerado parcela in natura e deverá integrar o salário do empregado para todos os efeitos legais.
Visualizando, temos:
Situação 1
Salário do empregado = R$ 900,00
Vale-refeição = R$ 260,00
Desconto máximo permitido = R$ 900,00 x 20% = R$ 180,00
Desconto efetivamente efetuado do salário = R$ 50,00
Parcela in natura a ser integrado ao salário = R$ 260,00 - R$ 50,00 = R$ 210,00
A parcela in natura de R$ 210,00 será considerada como parcela integrante da remuneração, sendo, a base de cálculo para a contribuição previdenciária e para o FGTS será R$ 1.110,00 (R$ 900,00 + R$ 210,00).
Situação 2
Salário do empregado = R$ 1.000,00
Vale-refeição = R$ 260,00
Desconto máximo permitido = R$ 1.000,00 x 20% = R$ 200,00
Supondo que, nesta situação, a empresa não faça nenhum desconto, a parcela in natura a ser integrada ao salário será o valor real a alimentação, ou seja, R$ 260,00.
Neste caso, a base de cálculo para a contribuição previdenciária e para o FGTS será R$ 1.260,00 (R$ 1.000,00 + R$ 260,00)
Ressaltamos que o valor da alimentação concedida fora do PAT deve ser lançado em folha de pagamento como proventos, para efeito de tributação e, posteriormente, descontado pois, o empregado já recebeu o valor em espécie.
3. Inscrição no PAT
O art. 500 e seguintes da Instrução Normativa RFB nº 971/09 determina que direito à inscrição no PAT alcança as empresas, bem como os contribuintes equiparados à empresa.
Nos termos do § 3º do art. 3º da citada Instrução Normativa, equipara-se a empresa para fins de cumprimento de obrigações previdenciárias:
a) o contribuinte individual, em relação ao segurado que lhe presta serviços;
b) a cooperativa, conforme nos arts. 1.093 a 1.096 da Lei nº 10.406/02 (Código Civil);
c) a associação ou a entidade de qualquer natureza ou finalidade, inclusive o condomínio;
d) a missão diplomática e a repartição consular de carreiras estrangeiras;
e) o operador portuário e o Órgão Gestor de Mão de Obra (OGMO);
f) o proprietário do imóvel, o incorporador ou o dono de obra de construção civil, quando pessoa física, em relação a segurado que lhe presta serviços.
Observa-se que a adesão ao PAT é voluntária, não existindo uma obrigatoriedade expressa.
De acordo com a Portaria SIT/DSST nº 3/02, para inscrever-se no PAT e usufruir dos benefícios fiscais, a pessoa jurídica deverá requerer sua inscrição à Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), por meio do Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho (DSST), do MTE, em impresso próprio para esse fim a ser adquirido nos Correios ou por meio eletrônico utilizando o formulário constante da página do MTE na internet (www.mte.gov.br).
A cópia do formulário e o respectivo comprovante oficial de postagem ao DSST/SIT ou o comprovante da adesão via internet deverá ser mantida nas dependências da empresa, matriz e filiais, à disposição do Auditor-Fiscal do Trabalho.
A documentação relacionada aos gastos com o PAT e aos incentivos dele, decorrentes, também, será mantida à disposição do Auditor-Fiscal do Trabalho, de modo a possibilitar seu exame e confronto com os registros contábeis e fiscais exigidos pela legislação.
A pessoa jurídica beneficiária ou a prestadora de serviços de alimentação coletiva registradas no PAT devem atualizar os dados constantes de seu registro sempre que houver alteração de informações cadastrais, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar informações ao MTE por meio da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS).
Se a beneficiária possuir filiais, localizadas em diferentes Unidades da Federação, o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) utilizado para inscrição será apenas o da matriz, estando esse registro estendido para as suas filiais. Entretanto, no preenchimento do formulário, a empresa deverá incluir os dados da matriz e de todas as filiais.
3.1. Inclusão e desconto do empregado
O PAT é destinado, prioritariamente, ao atendimento dos trabalhadores de baixa renda, isto é, àqueles que ganham até cinco salários-mínimos mensais. Entretanto, as empresas beneficiárias poderão incluir no programa, trabalhadores de renda mais elevada, desde que esteja garantido o atendimento da totalidade dos trabalhadores que recebem até cinco salários-mínimos e que o benefício não tenha valor inferior àquele concedido aos de rendimento mais elevado, independentemente da duração da jornada de trabalho (art. 3º, parágrafo único, da Portaria SIT/DSST nº 3/02).
A participação financeira do trabalhador fica limitada a 20% do custo direto da refeição.
3.1.1. Estagiários
De acordo com orientação do MTE os estagiários também podem ser beneficiados pelo PAT. Subentende-se que o benefício nessa situação não é obrigatório, porém, o recebimento não se caracteriza como desvirtuamento do programa. O fundamental é que haja contrato de trabalho de qualquer tipo. Os fins sociais do PAT justificam tal fato. O espírito da lei é evitar que o contribuinte utilize o incentivo fiscal em proveito de empregados de empresa com a qual não tenha relação, o que não é o caso de estagiários.
Dessa forma, a empresa beneficiária não está impedida de desenvolver programa de alimentação que atinja seus empregados, bem como os que trabalham no mesmo estabelecimento como estagiários.
3.2. Afastamentos do empregado - Fornecimento da alimentação
No caso de férias, licença-maternidade e afastamentos superiores a 15 dias, o trabalhador poderá receber o benefício da alimentação.
Apesar de a empresa não ter obrigação de conceder alimentação quando o trabalhador é afastado por doença, licença ou férias, não há nada que a impeça de conceder o benefício ao trabalhador, porém, como o PAT é um programa de saúde e em nada prejudica os seus objetivos, o MTE sugere a sua continuidade.
3.3. Execução do PAT
Para a execução do PAT, a empresa inscrita poderá manter serviço próprio de refeição ou de distribuição de alimentos, inclusive os não preparados (cesta de alimentos), bem como firmar Convênios com entidades que forneçam ou prestem serviços de alimentação coletiva, desde que essas entidades estejam registradas no programa e se obriguem a cumprir o disposto na legislação do PAT, condição que deverá constar expressamente do texto do convênio entre as partes interessadas.
Considera-se fornecedora de alimentação coletiva:
a) a operadora de cozinha industrial e fornecedora de refeições preparadas e transportadas;
b) a administradora da cozinha da contratante;
c) a fornecedora de alimentos in natura embalados para transporte individual (cesta de alimentos).
Considera-se prestadora de serviço de alimentação coletiva a administradora de documentos de legitimação para aquisição de:
a) refeições em restaurantes ou em estabelecimentos similares (refeição-convênio);
b) gêneros alimentícios em estabelecimentos comerciais (alimentação-convênio).
De acordo com o art. 6º da Portaria SIT/DSST nº 3/02 é vedado à pessoa jurídica beneficiária:
a) suspender, reduzir ou suprimir o benefício do programa a título de punição ao trabalhador;
b) utilizar o programa, sob qualquer forma, como premiação;
c) utilizar o programa em qualquer condição que desvirtue sua finalidade.
4. Trabalhador Rural
O art. 9º da Lei nº 5.889/73 estabelece que salvo as hipóteses de autorização legal (Imposto de Renda, Contribuição Sindical, ou Decisão Judicial, Pensão Alimentícia, etc.) só poderão ser descontados do empregado rural, as seguintes parcelas calculadas sobre o salário-mínimo:
a) habitação - até o limite de 20% para moradia;
b) alimentação - até o limite de 25% pelo seu fornecimento de forma sadia e farta, atendidos os preços vigentes na região.
5. Alteração Contratual
O art. 468 da CLT determina que nos contratos individuais de trabalho, a alteração das respectivas condições só é lícita quando houver mútuo consentimento e não resultar, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente dessa garantia.
Portanto, embora a legislação vigente assegure a liberdade de contratação das partes, resguarda as alterações contratuais contra a arbitrariedade do empregador, impondo que essa seja produto da manifestação de vontade das partes e, além disso, não cause prejuízo ao empregado, sob pena de ser considerada nula de pleno direito, não produzindo, consequentemente, qualquer efeito no contrato de trabalho.
Assim, considerando o anteriormente exposto, caso a empresa não efetue o desconto da alimentação do trabalhador e venha alterar tal condição, ou seja, passar a efetuar o desconto, causando prejuízo ao empregado, poderá ter esta alteração anulada.
6. Incentivo Fiscal
De acordo com o art. 581 do RIR/99 e a Instrução Normativa SRF nº 267, de 23/12/2002, a pessoa jurídica poderá deduzir do imposto devido o valor equivalente à aplicação da alíquota do imposto sobre a soma das despesas de custeio, realizadas no período de apuração em programas de alimentação do trabalhador (PAT), sem prejuízo da dedutibilidade das despesas, custos ou encargos.
As despesas de custeio admitidas no cálculo do incentivo são aquelas que vierem a constituir o custo direto e exclusivo do serviço de alimentação, podendo ser considerados, além da matéria-prima, mão de obra, encargos decorrentes de salários, asseio e os gastos de energia diretamente relacionados com o preparo e a distribuição das refeições, deduzidos os valores correspondentes à participação do trabalhador ficando esta, limitada a 20% do custo direto da refeição.
Maiores esclarecimentos sobre incentivos fiscais do PAT, consultar o Manual de Procedimentos nº 47/06 - Caderno de Imposto de Renda. |